Ministério da Agricultura suspendeu exportação de abatedouro de Mato Grosso após casos de covid-19
Luiz Henrique Mendes e Rafael Walendorff — De São Paulo e Brasília
Paulo Estivallet, embaixador do Brasil na China, alertou que medidas do país asiático representam risco à exportação — Foto: Pedro Teixeira/Agência O Globo
O maior controle exigido por Pequim para evitar uma segunda onda do novo coronavírus começou a afetar os frigoríficos brasileiros. Em um esforço de precaução, o Ministério da Agricultura suspendeu voluntariamente a autorização para o Frigorífico Agra, localizado em Rondonópolis (MT), exportar carne bovina à China. Ontem, a Administração Geral de Alfândegas do país asiático (GACC, na sigla em inglês) informou publicamente ter recebido a decisão do governo brasileiro.
O temor de outros frigoríficos é que a ocorrência de casos de covid-19 entre funcionários seja suficiente para bloquear mais abatedouros, ainda que não existam evidências de contaminação pela carne.
Na indústria, a decisão do Ministério da Agricultura provocou muita confusão. Enquanto uns encararam a medida como precaução necessária, outros atribuíram a suspensão a uma falha de comunicação entre os dois países.
Do ponto de vista estratégico, o Ministério da Agricultura teria razão para agir de forma voluntária, sustentam fontes do setor. Ao suspender a autorização para o Frigorífico Agra exportar, a Pasta tomou as rédeas do processo, evitando que os chineses vetassem a unidade por conta própria. Sendo assim, o ministério poderá reinserir o abatedouro na lista dos autorizados a vender para a China, afirma uma fonte.
Por outro lado, há quem argumente que a suspensão foi um grande mal-entendido. Conforme uma fonte, a GACC teria se equivocado ao receber informações sobre as medidas adotadas pelo frigorífico. Na semana passada, a unidade foi paralisada temporariamente por decisão da vigilância sanitária local. A parada, que ocorreu após a suspeita de casos de covid-19 entre os funcionários, motivou a testagem de todos os trabalhadores da companhia, o que permitiu que o frigorífico fosse autorizado a reabrir na segunda-feira.
“Por notícias e interpretações equivocadas, a GACC entendeu que, por causa da parada temporária, a planta teria sido suspensa pelo Ministério da Agricultura ou por iniciativa própria, o que não ocorreu”, afirma uma fonte. O Valor tentou contato com o Agra, mas não conseguiu localizar um porta-voz da empresa.
Procurado, o ministério negou que tenha havido uma falha de comunicação. “Não tem erros. Informamos às autoridades chinesas no domingo que, no momento, o estabelecimento estava suspenso por iniciativa deles para realização de testes nos funcionários, que teve um número de confirmados baixo. O estabelecimento já adotou as medidas necessárias de prevenção e voltou suas atividades. Agora o Ministério da Agricultura está preparando a documentação para solicitar a continuidade de exportação deste estabelecimento para China”, apontou a Pasta, em nota ao Valor.
O pano de fundo para o imbróglio que pôs executivos do setor frigorífico em alerta foi o reaparecimento da covid-19 em Pequim. Autoridades de saúde do país asiático estudam a hipótese de que a contaminação tenha ocorrido por meio de salmão importado. Nesse cenário, a embaixada brasileira em Pequim avisou que, como medida preventiva, o Bureau Municipal para Regulação de Mercado anunciou que reforçaria a inspeção de alimentos frescos e carne congelada.
Conforme o Valor antecipou, o Itamaraty transmitiu aos exportadores de carnes do Brasil, na quarta-feira passada, uma mensagem do embaixador do Brasil na China, Paulo Estivallet de Mesquita, alertando que as medidas anunciadas poderiam afetar as exportações.
Na quinta-feira, os exportadores receberam outra mensagem do Itamaraty. No texto, obtido pelo Valor, consta que a “autoridade sanitária chinesa solicita que o Brasil suspenda as exportações de produtos alimentícios cujos estabelecimentos produtores tenham identificado funcionários infectados com a covid-19, em situação que crie risco de contaminação dos alimentos”.
Questionado sobre o pedido chinês, o Ministério da Agricultura informou que o posicionamento da Pasta “está alinhado com o documento da FAO e da OMS, e baseado na nota técnica da Anvisa, que aponta que não há evidência científica da transmissão do covid-19 por alimentos. No momento, estamos atendendo uma solicitação de informações do país importador”.
Procurada, a Associação Brasileira de Proteína Anima (ABPA) também ressaltou “que não há risco de contaminação de alimentos” e frisou que as indústrias adotaram protocolo de prevenção “validado cientificamente pelo Hospital Albert Einstein”.
Fonte: Valor Econômico